Num momento em que muito se comenta acerca de alterações da Consolidação das Leis do Trabalho que o Governo está a propor, de forma a atualizá-la e adequá-la às realidades do cotidiano, surge a questão da cumulação dos adicionais de Insalubridade e Periculosidade e a polêmica quanto à obrigatoriedade de seus pagamentos, concomitantemente, ao empregado que, em sua atividade, esteja exposto a ambas as condições: insalubre e também perigosa.
Do texto original da C.L.T. consta, a respeito aos referidos adicionais, que o de insalubridade está contemplado no artigo 192, que estabelece: “O exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio e mínimo”, e assim fixava também a Sumula do C.TST. 228.
Todavia, após reiteradas investiduras postulando a incidência sobre o salário-base do trabalhador, o Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento, editando a Súmula Vinculante nº 4, reafirmando que deveria ser calculado sobre o valor do salário mínimo da região, observando-se ainda a escala classificando-o nos graus máximo, médio e mínimo.
Note-se que, por esta modalidade de trabalho, considerado condição especial, após 25 anos de prestação de serviços em atividade insalubre, o empregado pode postular a chamada aposentadoria especial, embora o valor do benefício mensal seja menor, se comparada com a do empregado que tenha optado pela percepção do adicional de periculosidade, cujo salário de contribuição seria de valor maior, conforme se demonstrará a seguir.
O mesmo texto da lei trabalhista, em seu artº 193, rezava que: “São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado”.
Em 2012, a questão foi atualizada e o artigo passou a contemplar também outras hipóteses, passando a ser assim redigido: “São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”.
Aqui o ganho mensal é maior porque o trabalhador recebe o adicional de 30%, que é calculado sobre seu salário base, e não sobre o salário-mínimo como ocorre com o adicional de insalubridade.
O parágrafo 1º. desse artigo disciplina que o adicional de 30 % incide sobre o salário, sem os acréscimos resultantes de gratificação, prêmios ou participações nos lucros da empresa.
Já o parágrafo 2º do mencionado art. 193 é o que estabelece a faculdade do empregado em cuja atividade estivessem presentes condições insalubres e também perigosas, de optar entre receber um ou por outro adicional, não podendo cumular as duas verbas trabalhistas.
Mas essa situação mudou porque cada um desses adicionais está protegendo um bem jurídico distinto e que não se confundem, devendo, ambos serem assegurados, quando for o caso.
São, portanto, institutos de direito distintos na legislação trabalhista: O adicional de insalubridade protege ou recompensa o trabalhador, que se submete ao trabalho em condições de ambiente de trabalho não saudável que pode lhe acometer alguma doença do trabalho; enquanto o adicional de periculosidade aproveita o trabalhador em maior sujeição a sofrer acidente do acidente do trabalho, com risco de morte.
É importante destacar, nesse aspecto, que o Brasil anuiu às disposições das Convenções Internacionais da OIT, de nºs 148 e 155 (publicado na LTR nº 11/2013, pág. 356), com o Colendo Supremo Tribunal Federal, uma vez provocado a se manifestar a respeito da possibilidade da cumulação dos dois direitos, pronunciou-se no sentido de declarar a constitucionalidade da percepção conjunta dos adicionais, e em detrimento da exigência da opção prevista no parágrafo 2º do artigo 193 da C. L. T., passando a reconhecer, com isso, ao empregado que se encontrasse na situação antes tipificada, o direito de receber simultaneamente ambos os adicionais.
E é certo que esse entendimento está pacificado também nos tribunais especializados, conforme se pode constatar da jurisprudência predominante e remansosa e atual, da qual destacamos alguns Vv. Acórdãos, que rezam:
“119000062203 – (…). ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE – CUMULAÇÃO – POSSIBILIDADE – Os adicionais possuem fatos geradores diversos, sendo possível o pagamento cumulativo de ambos. As Convenções Internacionais 148 e 155 da OIT relacionadas ao meio ambiente do trabalho e saúde do trabalhador são normas materialmente constitucionais ou supralegais, conforme decidido pelo STF, o que torna inaplicável o artigo 193, §2º da CLT.” (TRT 08ª R. – RO 0000025-90.2015.5.08.0114 – 1ª T. – Relª Desª Fed. Rosita de Nazare Sidrim Nassar – DJe 14.01.2016 – p. 2).
“113000188070 – ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE – CUMULAÇÃO – POSSIBILIDADE – No caso da insalubridade, o bem tutelado é a saúde do trabalhador, diante das condições nocivas no meio ambiente de trabalho. Já a periculosidade traduz situação de perigo que, uma vez ocorrida, pode ocasionar a morte do trabalhador, sendo a vida o bem a ser protegido. A Constituição Federal não veda a percepção simultânea dos adicionais, sendo que legislação infraconstitucional não pode estabelecer o contrário e restringir direitos assegurados. O artigo 193, § 2º, da CLT e o item 16.2.1 da NR 16 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego não foram recebidos pela atual Constituição Federal, eis que os seus conteúdos não se coadunam com os princípios e regras trazidos no texto constitucional. As Convenções 148 e 155 da OIT, incorporadas no nosso ordenamento jurídico, admitem a hipótese de cumulação dos adicionais. Por serem normas posteriores, especiais e mais benéficas ao trabalhador, devem prevalecer sobre as disposições contidas no artigo 193, § 2º, da CLT e no item 16.2.1 da NR-16 da Portaria 3.214 do Ministério do Trabalho e Emprego. Recurso da Reclamada negado.” (TRT 02ª R. – RO 00022226620135020013 – (20150872016) – 14ª T. – Rel. Francisco Ferreira Jorge Neto – DJe 14.10.2015) (grifamos).
Importante, pois, ressaltar que com a manifestação do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais especializados, pode-se dizer que o §2º do art. 193 da CLT não foi recepcionado pela Constituição Federal e pelas Convenções Internacionais antes mencionadas, às quais o Brasil é signatário, de sorte que o empregado que tenha trabalhado em condições insalubres e também perigosas, mas não tenha recebido por ambas, poderá postular esse direito, e respectivas diferenças, em Juízo, observada a prescrição de 5(cinco) anos.
Roberto Tortorelli